Faltam menos de três semanas para o começo dos principais campeonatos estaduais do Brasil. Em alguns estados, os torneios começam em duas semanas. Aliás, estes campeonatos são uma tradição de mais de um século. Em 2022, o primeiro campeonato estadual do Brasil comemora 120 anos de existência.
Porém, existem razões para a existência destes torneios, no formato que conhecemos, em um futebol altamente competitivo? A minha resposta é não. E aqui vou enumerar as razões pelas quais devemos repensar ou até mesmo acabar com os estaduais do jeito que eles são. E claro, mostrarei as soluções possíveis.
Razões para ser contra os estaduais no atual modelo de 16 datas
1. Muitos jogos de baixíssimo interesse, tanto do público, quanto da TV
Há muito tempo os campeonatos estaduais já não atraem tanto público, com exceção dos clássicos. Aliás, nem mesmo os clássicos são tão interessantes.
Um exemplo disso foi um Fla-Flu no campeonato Carioca de 2002, disputado na Rua Bariri, numa tarde de quinta-feira, com pouco público. A escolha da FERJ em não dar descanso para os quatro grandes, com o agravante de que Flamengo, Botafogo e Vasco simplesmente deram de ombros para o torneio, priorizando Rio-São Paulo (e no caso do Mengão, Libertadores), esvaziou o “Caixão”. Além disso, o torneio invadiu a Copa do Mundo, época em que todas as atenções do futebol estavam voltadas para a Coreia do Sul e Japão.
Leia também:
- Como reerguer os campeonatos estaduais?
- Copas Estaduais: a solução do calendário do futebol brasileiro
Por outro lado, a TV também amargou alguns prejuízos ao longo dos anos. Ainda tomando como exemplo o Rio de Janeiro, o fato de o Flamengo ficar fora de duas finais seguidas do Campeonato Carioca assustou a TV Globo, uma vez que o Rubro-Negro sempre foi o campeão de audiência. Tanto que a emissora chegou a impor uma expansão do torneio de 12 para 16 times. E com as novas determinações da CBF de limite de datas dos estaduais, a mesma FERJ teve que reduzir o número de times para 12 mais uma vez.
Hoje em dia, com exceção de um ou outro estado, nenhum estadual atrai público, ainda mais com o período de férias escolares e a concorrência com as fases finais da UEFA Champions League e o começo da Conmebol Libertadores.
2. O baixo nível de algumas partidas, que atrai manipuladores de resultados
Um dos grandes motivos para a falta de interesse do público é justamente o baixo nível de várias partidas. Qual jogo no início do ano atrai mais público e mais atenção: Real Madrid x Barcelona ou Boavista x Resende?
Claro que El Clásico vai atrair mais atenção, porque Barcelona e Real são times de altíssimo nível técnico. Isso é notório. E nestas partidas entre times pequenos, vem prevalecendo as ofertas dos manipuladores de resultados, pessoas que via, sites de apostas, na maioria das vezes, destroem a competitividade do esporte mais amado do mundo.
Desde a legalização das apostas esportivas, em 2018, já tivemos vários casos: do Paulista de Jundiaí na Série A3 do Paulistão até os bizarros escanteios do time do Goytacaz, na Série B1 do Carioca, passando até mesmo por casos suspeitos com jogos envolvendo times grandes, como em Vasco x Macaé, jogo que teve uma quantidade absurda de apostas no mercado de escanteios.
3. Ajudam a atrapalhar o planejamento de pré-temporada com o nosso já combalido calendário
A pandemia expôs uma verdadeira necessidade de se repensar o calendário, e por consequência, os torneios. As temporadas 2020 e 2021 foram praticamente emendadas por causa da decisão de colocar um Brasileirão de 20 times e 38 rodadas, com início em agosto.
Com o resultado, muitos times não tiveram nem pré-temporada e dias para treinar, uma vez que o intervalo entre partidas foi reduzido de 66 para 48 horas. Quem sofreu mais? Os jogadores, que muitas vezes, acabaram por se contundir por causa do excesso de jogos.
Para 2022, mais um calendário apertado: com a Copa do Mundo a partir de 21 de novembro, os torneios têm que terminar até o dia 13, mas tem estadual que vai certamente invadir o Mundial. Assim, com muitos jogos quase todo dia, não tem nenhum jogador que aguente.
Há algum tempo que defendo o fim dos campeonatos estaduais do jeito que eles são. Assim, os times grandes se livrariam de jogar partidas de baixo interesse e com as ligas regionais, como acontece em vários países europeus, os pequenos teriam um calendário cheio. Até tenho uma proposta engatilhada, com Séries A, B, C, D, E e F (estas duas últimas substituiriam os atuais estaduais). Um dia eu mostro aqui.
Porém, em várias discussões no grupo da revista Trivela no Facebook, algumas pessoas falaram que se os campeonatos estaduais acabarem, os times pequenos morrem. E por incrível que pareça, elas estão certas. Muitos times pequenos já revelaram grandes jogadores para o mundo. Serrano de Petrópolis com o Garrincha, União São João com o Roberto Carlos, Bangu com Ademir e Domingos da Guia, XV de Jaú com o pentacampeão Edmílson, Bragantino com o Mauro Silva, Guará com o também pentacampeão Lúcio…
Leia também:
- Começaram os estaduais, os nossos vilões favoritos
- 6 vezes em que os times do interior decidiram uma final estadual
Além disso, os times pequenos, de subúrbio ou do interior, costumam empregar pessoas que seriam rejeitadas pelo mercado de trabalho comum: idosos e deficientes físicos. Sem contar que a vinda de um grande time como o Corinthians a uma cidadezinha do interior, como Monte Azul Paulista, acaba movimentando a economia daquela localidade. Araras, que não é uma grande cidade, já esteve na elite do campeonato nacional, recebendo grandes clubes. Mesma coisa para Bragança Paulista, Juiz de Fora, Juazeiro do Norte, Chapecó, Londrina, Duque de Caxias, Volta Redonda, Varginha, Uberlândia…
Pensando nisso, venho apresentar uma proposta que não é radical, mas equaliza muito a relação entre grandes e pequenos e uma que pode até gerar um pouco de desinteresse, mas que amplia para todos os times das três primeiras divisões do campeonato nacional uma coisa que o Athletico Paranaense já faz há anos: um time sub-23 para os estaduais, mas com um ônus: o fim do Brasileirão de Aspirantes.
1. Estaduais com os grandes em fases mais avançadas, como no Ceará
A primeira proposta seria usar uma fórmula idêntica ao que o Campeonato Cearense adota há anos. Por lá, os times menores e o Ferroviário jogam uma primeira fase e os melhores se juntam aos dois principais times do estado: Ceará e Fortaleza. No caso, ela seria ampliada para times que jogam as Séries A, B e (em alguns casos) C, que assim, teriam mais tempo para descansar e treinar.
Como seria aplicado? Vamos pegar como exemplo o Rio de Janeiro. Por aqui, o Campeonato Carioca, que atualmente tem cinco divisões, passaria a ter apenas três, com a fusão das Séries A e A2, e B1 com a B2. No caso da primeira divisão, 20 times pequenos se enfrentariam em turno único, com os quatro primeiros indo para a fase final, se juntando a Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco. Nesta segunda fase, jogos em pontos corridos, apenas em ida. E o time que somar mais pontos seria o campeão. No caso, os grandes teriam quatro jogos a menos.
2. Um modelo de 13 datas, mas com os grandes usando times sub-23
A segunda ideia seria usada apenas para os estaduais dos estados com times divisionados e usa um modelo usado com certo sucesso pelo Athletico Paranaense e que o Flamengo também faz: o uso de um time de aspirantes.
Porém, com isso, o Brasileirão de Aspirantes seria extinto, uma vez que não faz o menor sentido ter um torneio que ninguém liga, quando existe uma oportunidade muito melhor de mostrar os jovens talentos.
Junto com essa obrigatoriedade, os estaduais teriam três datas a menos nos estados com times divisionados. Exemplo: o Campeonato Carioca teria o atual formato (12 times, com semifinal e final). Mas ao invés de jogos de ida e volta, a fase final seria em jogo único.
Já o Paulistão teria dois grupos de oito times, com os clubes jogando dentro dos grupos e quartas de final, semifinal e final, só que em ida e volta, totalizando assim, 13 datas.
Bom, como eu falei, o mundo ideal seria com os grandes não enfrentando os pequenos, até porque já existe um torneio pra isso, a Copa do Brasil. Mas como para dezenas de times, enfrentar os grandes é ainda muito importante, talvez a minha ideia possa realmente equilibrar a balança.
Comentários