Texto escrito por Davi Saito (Por Fora das Quatro Linhas @pfqloficial)
No último “O que aconteceu”, o escolhido foi o Flu de Feira, clube tradicional da Bahia que busca se reerguer após anos no ostracismo. Agora falaremos sobre o Gama, clube de Brasília que se destacou bastante, mas está sumido do cenário nacional nos últimos anos. Vem com a gente!
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História
A Sociedade Esportiva do Gama foi fundada em 15 de novembro de 1975 por Hermínio Ferreira Neves, o Tim, na região administrativa do Gama, Distrito Federal. Sua primeira partida foi em 21 de fevereiro de 1976 contra o Humaitá, vencida por 2 a 0 e válida pelo Torneio Imprensa.
Apesar do nome inusitado, o Torneio Imprensa era um campeonato sério, sendo considerado o primeiro torneio oficial no novo regime profissional do DF. Assim, o Gama venceu este torneio em 1977 e 1978, o que tornou o time bastante popular.
Em 1979, veio o primeiro estadual do Gama, que derrotou o seu rival Brasília na final. Na época, a vitória foi considerada um “Davi vs Golias”, pois o Brasília era o atual tricampeão do estado e tinha mais dinheiro. Com o título, o Gama também disputou o Brasileirão de 1979, com um grande público em seu estádio, o Bezerrão.
Uma curiosidade sobre o ano de 1979 é que, segundo registros do Futebol 80, o Gama enfrentou a Seleção da Nigéria no Bezerrão e, simplesmente, venceu por sonoros 4 a 0. Em 1981, o Alviverde conquistou seu primeiro título regional: o Torneio Centro-Oeste. Nesse período, o clube foi convidado a disputar o Campeonato Goiano, mas recusou.
O restante da década de 80 não foi muito proveitoso para a equipe: Primeiramente, ocorreu a promoção Gamão Milionário, que seria uma forma de torcedores financiarem o clube por meio de carnês. No entanto, a promoção foi um fracasso que colocou o clube em severas dificuldades e, por muito pouco, não o levou à extinção.
Na década de 90, o clube começou a ser reconstruído financeiramente, e o protagonista tem nome: o empresário Wagner Marques, que injetou recursos financeiros no clube e, com isso, este virou protagonista no cenário local. Dessa forma, o Gama ganhou seis estaduais na década, além da Série B de 98.
Após o polêmico Caso Sandro Hiroshi (leia abaixo), o Gama foi punido pela FIFA em 2000 por ter ido à Justiça Comum contra a CBF, o que gerou uma outra briga nos tribunais, desta vez por conta da final do Candangão daquele ano. O juiz Jansen Fialho de Almeida, da Vara Cível de Planaltina, logo após a suspensão, concedeu uma liminar que permitiu ao Gama jogar a decisão.
Depois de uma longa batalha e alguns adiamentos da final por conta da indecisão sobre o assunto, a final foi realizada algumas semanas depois da data original, com o Gama sagrando-se campeão. Na Copa João Havelange, ficou em 22º dentre os 25 times do Módulo Azul.
A partir do século XXI, o Brasiliense tornou-se o grande rival do Gama e, infelizmente para o Alviverde, um contraste interessante aconteceu: enquanto o Brasiliense ascendeu, o Gama caiu. Em 2002, veio o rebaixamento para a Série C, da qual foi vice em 2004.
A partir de então, o Gama passou a ter, apenas, alguns feitos positivos esporádicos, já que o Brasiliense dominou o cenário estadual. Alguns desses feitos foram as classificações sobre Botafogo (2004) e Vasco (2007) na Copa do Brasil, que incluíram o adiamento do gol 1000 de Romário.
Declínio
Em 2008 o Gama foi rebaixado para a Série C e, em 2010, para a Série D. Porém, o pior ainda estava por vir: após 20 anos como presidente, Wagner Marques deixou o clube, colocando-o em uma fase de transição da qual, aparentemente, não saiu até agora.
Apesar de tudo, o Gama ainda conseguiu alguns respiros, como o fim do jejum de 12 anos no Candangão em 2015 e a participação na Copa do Brasil de 2012, na qual foi eliminado na primeira fase. Além disso, fez uma excursão pela Europa em 2014, jogando contra times como o Charleroi, da Bélgica, e o NAC Breda, da Holanda. Por fim, chegou à final da Copa Verde em 2016, perdendo para o Paysandu.
O pior para o Gama veio em 2020: apesar do bicampeonato candango em 2019 e 2020, o clube passou por uma severa dificuldade financeira, agravada pela pandemia. Dessa forma, salários ficaram atrasados por sete meses, e o elenco entrou em greve.
Em relato ao @geglobo, a então diretoria do Gama disse que os atrasos ocorreram por conta de recursos do exterior não recebidos. Além disso, a equipe feminina teve que pagar a inscrição para o Candangão da modalidade do próprio bolso, já que o clube não as custeou.
Ainda em 2020, o Gama perdeu seu patrocinador, e a torcida teve que ajudar a equipe com uma vaquinha virtual, que arrecadou alguns milhares de reais para custear a equipe. Por fim, o clube obteve um empréstimo de R$ 400 mil dando como garantia uma área de 20 mil m² no valor de R$ 2 milhões, segundo apuração do Distrito do Esporte.
Com o grande rombo nas finanças, o resultado esportivo não demorou: com um fiasco na Série D em 2021, o clube está sem divisão nacional desde então e não vai à final do Candangão desde 2020, o que diminui suas receitas e, por consequência, aumenta a criese financeira. Segundo estimativa do Correio Brasiliense, a dívida em 2021 chegou aos R$ 20 milhões.
SAF (ou não) e atualmente
Em 2021, o Gama tornou-se uma Sociedade Anônima do Futebol (SAF) visando abater suas dívidas e captar investimentos. Na época, o clube até criou uma criptomoeda, a Gama Utility Token (GAMAO). Porém, o projeto não durou muito tempo.
No ano seguinte, a Junta Comercial, Industrial e Serviços do DF (Jucis-DF), após longa batalha entre a Sociedade Esportiva do Gama e o Gama SAF, extinguiu a SAF e seu CNPJ, o que basicamente levou o clube à estaca zero e devolveu à Sociedade Esportiva o comando do futebol do clube.
Em entrevista ao @geglobo, o especialista em Direito Desportivo e advogado Victor Amado explicou o motivo da extinção:
“A decisão vem anteriormente a uma decisão que determinava a juntada de atos constitutivos da Green White, uma empresa sediada no exterior, que seria a maior investidora da Gama SAF. Essa juntada dessa documentação não foi realizada dentro do prazo estabelecido pela Junta, não atendendo a um requisito essencial do Direito Brasileiro, que é a demonstração de quem são os diretores, os constituidores desta empresa”
Dessa forma, o Gama tenta se reconstruir sem uma SAF. No atual Candangão, o clube é vice-líder da primeira fase, com 19 pontos em 8 jogos, e a meta é obter uma vaga na Série D de 2025. Neste ano, o Gama não terá divisão nacional para disputar.
Conclusão
O Gama é um dos times mais tradicionais do DF. Mas por conta de má gestão financeira e da falta de adequação ao futebol moderno, ficou para trás. Hoje não consegue ao menos ser protagonista no estadual. Para se reconstruir, o caminho é longo, pois há uma forte crise econômica, baixas receitas e falta de maior aporte financeiro.
Extra: o caso Sandro Hiroshi
No Brasileirão de 1999, Sandro Hiroshi era jogador do São Paulo. Apesar de ter sua identidade adulterada (foi registrado como nascido em 1980, mas nasceu em 1979), o grande “x” da questão não é esse. O Tricolor Paulista escalou o jogador de maneira irregular em dois jogos do campeonato: uma goleada contra o Botafogo por 6 a 1 e um empate contra o Internacional em 2 a 2.
Desta forma, as duas equipes pediram, respectivamente, três e dois pontos à Comissão Disciplinar do Tribunal de Justiça Desportiva (TJD), que deu causa ganha àquelas. E é neste ponto que o Gama vira protagonista.
O rebaixamento para a Série B funcionava de um jeito bem diferente: os rebaixados seriam aqueles que tivessem as quatro menores médias entre as pontuações de 1998 e 1999. Era um sistema de média ponderada, que pode ser entendido da seguinte forma:
Pontuação = [(P98/23) + (P99/21)]/2, sendo que haviam 23 jogos em 98 e 21 em 99. No caso dos times como o Gama, que jogaram a Série B em 98, a média era simplesmente P99/21.
Seguindo esta lógica, os três pontos que o Botafogo ganhou nos tribunais livraram o clube do rebaixamento e colocaram o Gama na Série B (segundo a Wikipedia, o Botafogo ficou com média de 1,249, sendo o primeiro fora da zona, enquanto o Gama terminou com 1,238).
Insatisfeito com a desorganização do torneio e, principalmente, com a queda no “tapetão”, o Gama foi à Justiça Comum contra a CBF. A principal alegação era que, segundo resolução do Código Brasileiro Disciplinar do Futebol, o Botafogo não deveria ter ganho os pontos. Entretanto, o TJD seguiu uma outra resolução, a da CBF. Com essa polêmica, o clube brasiliense obteve sucesso e a CBF ficou incapacitada para organizar a edição seguinte do Brasileirão.
A Copa João Havelange
Com o sucesso da ação do Gamão, o Clube dos 13 assumiu a organização da próxima edição do Brasileirão e, após acordos judiciais e até uma intervenção da FIFA, foi criada a Copa João Havelange para o ano 2000. O torneio tinha um funcionamento bem diferente, com quatro módulos.
Depois a fase final era disputada por 16 times em formato mata-mata, e o vencedor seria proclamado como o campeão brasileiro. Dessa forma, o Vasco venceu o São Caetano na final (com direito à icônica logo do SBT no uniforme).
Relembre a Copa João Havelange no “Aquele Brasileirão”:
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