Texto de autoria de Márcio Pereira
A Copa São Paulo de Futebol Júnior é um ótimo aperitivo no mês de janeiro, mas costumamos perceber que o ano futebolístico começa no País a partir do início dos campeonatos estaduais, por mais que a discussão sobre o que fazer com eles só aumente com o tempo.
Com a participação do Flamengo no Mundial de Clubes, ao fim de 2019, entrou em discussão o número excessivo de partidas a que os clubes de elite brasileiros se submetem, mesmo em comparação com os clubes ingleses — que frequentemente protestam em relação a esse assunto. O Flamengo chegou a 74 jogos oficiais na derrota para o Liverpool, havendo muita discussão acerca do que fazer para “aliviar” esse número, e mais uma vez os campeonatos estaduais são considerados os “vilões”.
Que o atual modelo de campeonatos estaduais está defasado é um consenso geral. Os clubes das principais divisões disputam muitos jogos desnecessários, mesmo que este número tenha caído nos últimos anos. Porém, não há como negar que estes campeonatos fazem parte da tradição e da cultura futebolística brasileira. Então, o que fazer?
Simplesmente acabar com esses campeonatos não é uma solução. Além dos clubes pequenos terem chance de jogar com os maiores de seu estado, em muitos casos grandes clubes tradicionais que têm passado longe de títulos nacionais e internacionais usam estes campeonatos como uma chance de dar uma alegria as suas sofridas torcidas.
Ou alguém acha que o São Paulo não iria comemorar ganhar o título paulista após quinze anos? Ou que o Botafogo, o Fluminense, o Vasco…. Esses clubes passam por momentos que nada lembram os melhores de suas histórias, então os respectivos estaduais passam a ser mais importantes.
Por outro lado, por que não transformar estes torneios em algo mais concentrado e com menos datas? Uma ideia é pegar os clubes que não possuem calendário nacional no segundo semestre e fazer seletivas que classifiquem os melhores desses clubes ao campeonato estadual no começo do ano seguinte, aí sim juntando as agremiações que estavam ocupadas com o campeonato brasileiro.
Fase de grupos, eliminatórias em jogo único, no máximo seis ou sete datas, possibilitando que o campeonato brasileiro se inicie algumas semanas antes, e que possa parar quando ocorrem jogos da Seleção. Essa ideia proporcionaria também calendário maior a todos os clubes profissionais do país, pois as seletivas poderiam ser estendidas de modo a ocupar estes times por mais meses.
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Então, se na teoria é algo tão simples a se fazer, por que nada muda? As federações estaduais detêm um poder de barganha grande. Por mais críticas que existam ao atual modelo do futebol nacional, os modorrentos campeonatos regionais garantem uma fonte de renda a estas federações, por mais que a detentora dos direitos de transmissão para a televisão aberta e fechada na maioria dos estados sinalize com uma retirada de patrocínio, até o momento os torneios são vantajosos financeiramente, pelo menos se forem consideradas as maiores federações, que lucram um percentual a cada jogo.
Há o exemplo do Nordeste. Os principais clubes desta região se organizaram e peitaram as federações, recriando a Copa do Nordeste — por mais que esta tenha deixado a classificação por mérito um pouco de lado nos últimos anos, priorizando sempre as maiores agremiações — e alcançando resultados esportivos e financeiros muito satisfatórios.
Embora, teoricamente, seja mais um torneio a preencher o calendário destes times, quem participa da “Lampions League” (como é carinhosamente chamada) costuma dar prioridade a ela, deixando o seu respectivo estadual um pouco mais de lado, pelo menos em suas fases iniciais. Se por um tempo foram relegados ao ostracismo, clubes tradicionais como Bahia, Sport, Fortaleza e Ceará mostram sinais de recuperação, com organização e resultados melhorando em campo.
Por fim, por mais força que a CBF e cada federação regional tenha, cabe apenas aos clubes sentarem e pensarem no que fazer para melhorar o futebol brasileiro como um todo. O exemplo nordestino está aí, claro que com uma outra forma de ação, mas o princípio de união e força está posto.
Seja como for, o que não pode mais acontecer é o problema dos estaduais ser empurrado com a barriga, como tem sido feito nos últimos anos. Mudar a visão sobre eles, de torneios longos e desinteressantes demais, para uma importante forma de preparação para a temporada é essencial. Não precisamos abrir mão desta tradição do nosso futebol, nem de jogos como Flamengo x Vasco, Atlético x Cruzeiro, Palmeiras x Corinthians ou Grêmio x Internacional valendo título.
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