Inaugurado em 2010, o Museu do Futebol e Esportes de Araraquara é um dos poucos espaços empenhados na preservação da memória esportiva do interior de São Paulo. O espaço conta com fotos, troféus, camisas e outros objetos relacionados á história do futebol e de outras modalidades na cidade da Morada do Sol. O destaque são itens relacionados á Ferroviária, equipe que disputa a Série A-2 do Campeonato Paulista. “Disponibilizamos para consulta cerca de 10 mil fotos para o grande público”, explica Gustavo Ferreira Luiz, monitor do museu. O Última Divisão conversou com ele por telefone e recomenda a visita.
ÚLTIMA DIVISÃO: Como surgiu a ideia de fazer o museu?
Gustavo Ferreira Luiz: Araraquara tinha quatro museus. Quando o estádio da Fonte Luminosa deixou de pertencer a Ferroviária, ele passou a ser da Prefeitura , que quis aproveitar o espaço para montar um museu de futebol no local. Sempre se falou de o estádio não ser um ponto turístico apenas nos dias de jogos, mas algo mais. Como a Ferroviária é um time tradicional, a ideia era fazer um memorial focando a equipe em exposições permanentes. Mas isso não se restringe apenas ao futebol, também temos no acervo artigos de outras modalidades. O museu existe desde 10 de março de 2010.
UD: Quais são os principais itens do acervo?
GFL: São fotos, troféus, camisas, flâmulas, faixas, jornais históricos e vídeos. Nós disponibilizamos para consulta cerca de 10 mil fotos que contam a história do esporte em Araraquara. Expomos de 180 a 200 fotos e trocamos periodicamente os materiais. Mantemos também uma pequena biblioteca histórica com revistas e jornais. Normalmente, recebemos visitas de todos os tipos de instituições, como escolas, universidades, asilos, etc.
UD: Araraquara teve outros times profissionais antes da Ferroviária. O museu também possui itens dessas equipes?
GFL: Sim. Temos muitas fotos do começo do futebol aqui na cidade. Isso tanto da ADA, do São Paulo, equipes profissionais do início do século que não chegaram a disputar o Campeonato Paulista. Desses times temos mais registros. Esse material pode ser disponibilizado para o grande público se for realizada alguma exposição temática do surgimento e do crescimento do futebol em Araraquara, por exemplo. Mas é óbvio que a maioria dos itens são relacionados a Ferroviária.
UD: Falando de outras modalidades, Araraquara teve um nome de destaque no ciclismo, o Anésio Argenton. O museu possui muitos itens sobre ele?
GFL: Sim. Temos troféus, medalhas e jornais falando de suas conquistas, suficiente para fazer uma exposição específica sobre ele. Recentemente, a ESPN Brasil produziu um documentário sobre o Anésio em que 80% a 90% de material foi cedido pelo museu. O Anésio foi o maior ciclista brasileiro de todos os tempos. Ele conquistou inúmeros títulos e foi campeão sul-americano na modalidade. Talvez o fato mais relevante da carreira dele seja a quinta colocação nos Jogos Olímpicos de 1960. Nessa época, ele era patrocinado pela Ferroviária, inclusive. A equipe de futebol profissional e os atletas eram mantidos pela Estrada de Ferro, portanto todas as viagens e provas que o Anésio competiu acabou sendo com o patrocínio da Ferroviária. Ele sempre disputava os Jogos Abertos do Interior por Araraquara.
UD: O Bazzani é considerado o mais importante jogador da história da Ferroviária. O museu tem bastante coisa sobre ele?
GFL: Sim. Em frente ao estádio existe um busto em homenagem a ele. Na entrada do museu existe um banner com os números dele. O Bazzani foi o atleta com o maior número de títulos, jogos e gols da Ferroviária. Ele disputou 758 partidas pelo clube, um número que dificilmente algum jogador vai conseguir chegar. Pode ser até que em algum time grande alguém chegue perto, mas no interior isso não vai acontecer. Ele ficou uma vida inteira dentro da Ferroviária, de 1954 a 1976. Só ficou longe por dois anos, quando teve uma passagem pelo Corinthians. Uma curiosidade é que o Bazzani não foi revelado pela Ferroviária, mas chegou de Mirassol com 17 anos. A Ferrinha foi seu primeiro time profissional, mas não o revelou.
UD: Quais foram as dificuldades em reunir esse acervo?
GFL: Nós continuamos reunindo esse material até hoje. Nossa maior dificuldade é achar parte do material histórico que se perdeu. Muita coisa acabou se perdendo quando o estádio foi reformado e parte do acervo não foi bem preservado. É um trabalho constante. Daqui a 30 anos ainda vão ter pessoas garimpando coisas do esporte de Araraquara. Tudo começou quando o seu Paschoal Gonçalves da Rocha reuniu um grande material alusivo à história do esporte na cidade. Ele guardava reminiscências esportivas na sala de casa, que não tinha acesso para o público em geral. O museu foi criado pra continuar garimpando todo esse material. Nós ficamos seis meses recuperando e digitalizando o acervo do seu Paschoal. Muita gente que não mora em Araraquara, quando vem aqui, nos cede material. Então, é algo constante. Sempre vai ter algum material novo chegando.
UD: A Ferroviária não disputa a primeira divisão estadual desde 1996. Na sua opinião, o que poderia ser feito para a agremiação voltar a ser um dos grandes do estado?
GFL: Eu não mantenho ligação nenhuma com o clube, a não ser como torcedor. Acredito que os times tradicionais como o XV de Piracicaba, Botafogo de Ribeirão, Ferroviária dão mais repercussão no Campeonato Paulista do que os times novos. Nestes times, muita gente quer mandar nos momentos bons. Acaba tendo muito cacique pra pouco índio. Mas quando a mesma equipe está na segunda ou na terceira divisão, muitos nem se lembram que o clube existe.
A Ferroviária ficou de 1966 até 1996 na primeira divisão do Paulista. Hoje é impossível um time do interior ficar trinta, quarenta anos na mesma divisão. Existiam menos times no estado, a concorrência era pequena. Todo ano sobem e caem quatro agremiações. Outro fator que dificulta muito é esse calendário. O ano para as equipes do interior dura dois meses. Diziam que a Copa Paulista era uma espécie de laboratório pro ano seguinte. Mas isso é uma bobagem, muitos times que vão mal na Copa Paulista acabam indo bem no estadual depois, e vice-versa. Isso é um mal que afeta todos os times do interior que vivem como verdadeiros boias-frias. A Ferroviária não vai disputar o Campeonato Brasileiro. Então, precisamos preparar um time profissional pra ter atividade durante dois, três meses. É impossível continuar assim.
Nós chegamos a escrever uma carta relatando essa situação e entregamos uma cópia para o zagueiro Paulo André do Corinthians. Ele chegou a citar essa carta quando deu entrevista no programa Bola da Vez da ESPN Brasil e divulgou esse material no Facebook do Bom Senso. Nessa carta, a gente aborda que o ideal seria que os times grandes disputassem o Brasileiro e que o Estadual acontecesse durante o ano inteiro sem a presença dos grandes. Foi um combustível que esperamos ter contribuído em algo para o pessoal do Bom Senso.
UD: Na sua opinião, o que a Federação Paulista de Futebol (FPF) poderia poder fazer para ajudar esses times tradicionais como a Ferroviária?
GFL: Eu sonho com um Campeonato Paulista que começa em janeiro e acaba em novembro. Os times grandes ficariam disputando o Brasileiro. Seriam competições paralelas. Dessa maneira, você poderia contratar um jogador durante o ano inteiro. Podia formar um time forte e teria tempo pra engrenar, entrosar. Mesmo os patrocinadores ficariam mais interessados. Afinal, a competição não duraria dois, três meses. O campeonato ficaria mais valorizado.
Museu do Futebol e Esportes de Araraquara
Rua Mauro Pinheiro, 150, Araraquara (SP)
Telefone: (16) 3322-2207
Aberto de segunda à sexta, das 8h às 17h e sábado das 8h30 às 12h
Entrada gratuita
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