O ano de 2018 foi de festa para o torcedor da Associação Atlética Iguaçu: após nove anos longe dos gramados profissionais, a Pantera do Vale está de volta. A refiliação na Federação Paranaense de Futebol (FPF) aconteceu em dezembro de 2018 e, em 2019, o time poderá disputar novamente o estadual.
Dentre os que celebraram o retorno do Iguaçu está um torcedor em especial: o padre Emilio Bortolini Neto. Amante de futebol e fanático pelo clube desde a infância, Emilio viveu alguns anos na Europa, sobretudo na capital italiana de Roma, por conta de seu ofício. Por isso, acompanhava o Iguaçu de longe. Ao retornar ao Brasil, se deparou com a triste surpresa de ver seu time do coração com as portas fechadas e longe do futebol por conta de uma série de dívidas e divergências com a FPF.
Para ajudar o único time da cidade de União da Vitória (PR) a se reerguer foi formado o grupo Amigos do Iguaçu, do qual o padre faz parte. Foram feitos diversos eventos, como bingos, para arrecadar dinheiro e pagar a dívida com a Federação e com a CBF.
Por conta disso, o padre (que hoje reside na vizinha Porto Vitória) decidiu lançar o livro Onze por Todos, Todos por Onze, que cita dos grandes feitos da Pantera do Vale por meio de canções. Por isso, o projeto vem acompanhado de dois CDs musicais e um DVD especial com momentos de glória do Iguaçu. Segundo Emilio, as músicas bebem da fonte de artistas como Beatles, Led Zeppelin e Bob Dylan, entre outros grandes nomes do rock mundial.
Para contar mais sobre essa obra, que pode entrar para o Guinness Book, o padre Emilio Bortolini conversou com o Última Divisão sobre a paixão pela música, pelo futebol e, claro, pelo Iguaçu de União de Vitória.
UD: Quando e como surgiu o projeto de escrever um livro e criar músicas para um cd em homenagem ao Iguaçu de União da Vitória?
Padre Emílio Bortolini: Em Outubro de 2017, vi, numa rede social, a hashtag #apanteraestavoltando. O apelido do Iguaçu é “Pantera do Vale”. Imediatamente pensei: “Isso é nome de música!” A princípio, seria só uma canção, sem nenhuma pretensão, mas, aos poucos, outras começaram a vir, e pensei em fazer 11, devido ao número de jogadores de um time de futebol. Compus essa canção no dia 3 de novembro, e mais outras três no mesmo dia. Os compromissos paroquiais do final de semana me obrigaram a interromper, mas na segunda compus mais sete canções.
UD: É verdade que seu pai é autor do hino da cidade de União da Vitória? O que conseguiu de inspiração com isso?
EB: É verdade, sim. E também do Hino da Cidade de Matos Costa e da UNIUV, uma das Universidades de União da Vitória. Não posso dizer que me inspirei nos hinos, porque são estilos bem diferentes, mas, certamente, meu talento musical vem dele.
UD: O que o leitor e o ouvinte vão encontrar no livro e no CD Onze por Todos. Todos por Onze?
EB: Nos CDs encontrarão 25 músicas inéditas, nos estilos de rock, folk, country, blues, pop e até música caribenha. No livro, encontrarão comentários sobre as músicas em quatro etapas. A primeira, chamada “Óculos” trata do assunto da canção, revelando a inspiração da mesma e algumas referências escondidas na letra; a segunda chama-se “Pontes” e liga o assunto da canção à vida cotidiana, mostrando como ela pode nos dar novos horizontes; a terceira é chamada de “Escadas”, pois transforma o assunto em questão em oração, em assunto de uma conversa com Deus, pedindo (por si e pelos outros), agradecendo, louvando. Por fim, a última parte é interativa, composta de linhas em branco com o título “Sua vez”, onde o leitor pode acrescentar suas percepções de cada canção. Na Introdução, incentivo as pessoas que o fizerem a me mandarem seus escritos por email, para que elas sejam acrescentadas ao livro, caso tenha uma segunda edição.
UD: É verdade que buscou inspiração em bandas como os Beatles para gravar as músicas de homenagem ao Iguaçu, inclusive gravando no ritmo rock’n’roll? Quais outras bandas estão na sua preferência musical?
EB: Desde minha adolescência venho ouvindo Beatles, especialmente a carreira solo de George Harrison, cujas músicas me fizeram começar a pensar em ser padre. Também Bob Dylan, Tom Petty, Eric Clapton, Led Zeppelin, Rolling Stones, The Band, Van Morrison, Rory Gallagher, Horslips, Bruce Springsteen, Buddy Holly, Stevie Ray Vaughan, B.B. King, Ottis Redding, The Who.
Minha banda preferida é o projeto Traveling Wilburys, no qual os gigantes George Harrison, Bob Dylan, Tom Petty, Roy Orbison e Jeff Lynne não só fizeram canções maravilhosas, como expressaram meu modo de viver a vida: estar rodeado de amigos, sem pretensões nem vaidade, inspirando e sendo inspirado por pessoas que se ama e que nos amam. De todos esse nomes, acho que meu trabalho se aproxima mais do Tom Petty, falecido em 2017.
UD: Além do lançamento do livro Onze por Todos, Todos por Onze, você esteve próximo do clube na condição de associado. Participou de reuniões ou debates que empolgassem os demais sócios na volta do Iguaçu de União da Vitória ao futebol profissional do Paraná após alguns anos de afastamento?
EB: Atualmente estou morando em outra cidade, atendendo sozinho uma paróquia com 15 capelas. Embora fique perto de União da Vitória, cerca de 20 km de distância, os compromissos pastorais me impedem de participar dessas reuniões. Mas sou sócio, sim.
UD: Como surgiu a sua paixão pelo Iguaçu de União da Vitória? Já era ou pretendia ser padre nessa época?
EB: Meu pai me levava ao estádio desde que eu era criança, fazendo do time um componente da minha história. Não pensava em ser padre nessa época.
UD: Houve algum momento de maior satisfação na vida do Iguaçu de União da Vitória na sua vida?
EB: Durante o ano de 1987, fui assistir a todos os jogos do Iguaçu em União da Vitória e acompanhei pelo rádio os jogos fora. E naquele ano fomos campeões da segundona, ganhando do Operário em Ponta Grossa!
Nesse time jogava o Luizinho Cruz, um dos meus preferidos. Junto, também, havia o Belga, que eu vi jogar poucas vezes, mas que foi meu técnico num campeonato de futebol de salão da 4ª série (risos). Ele chegou a falar com meu pai sobre mim, dizendo que eu seria um ótimo goleiro e que tinha muito futuro no futebol, mas acho que ele pensava que eu cresceria mais (risos). Tenho 1,70 (risos). Porém, quando entrei para o seminário, em 1991, não pude mais ver os jogos, pois o bispo era muito linha dura (risos).
UD: Como decidiu ser padre?
EB: Charles de Foucauld expressou minha experiência com perfeição ao dizer: “Quando percebi que Deus era real, não consegui me imaginar vivendo se não em função e a serviço d’Ele”. Acho que eu devia processá-lo por “roubar” meu sentimento (risos). Nesse processo, foram fundamentais músicas do George Harrison, como My sweet Lord, Life itself, That Which I Have Lost, Hear me Lord, e outras.
UD: Em algumas das missas, já convidou os fieis a aderirem ao amor pelo clube local – o Iguaçu?
EB: Só apresentei o trabalho, mas acho que a missa não é lugar para isso. A estrela ali é Cristo, nem eu nem o time (risos). Em conversas e outros momentos, sim.
UD: É comum no futebol brasileiro existir associação entre esporte e fé. O Athletico Paranaense aderiu à imagem de Nossa Senhora Salete para pedir proteção. Um dos futebolistas mais importantes do Paraná, Dirceu Krüger, atleta ícone do Coritiba, já chegou a receber a extrema unção depois de uma lesão no futebol e também que já foi pedir bênçãos no Santuário Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Em Paranaguá, em algumas temporadas o Rio Branco levou seus jogadores a pedir proteção da Nossa Senhora do Rocio. Em 1992, o Londrina foi até a catedral da cidade pedir auxílio divino antes da final do Estadual. Tem alguma opinião formada sobre o assunto? Existem prós ou contras nisso, até mesmo por haver apenas um vencedor no futebol?
EB: No sentido de proteção contra lesões e outros problemas, como violência das torcidas, e tantas outras coisas. Acho muito válido, mas não concordo em querer fazer de Deus um torcedor de um time que vai “puxar o tapete” do outro. É muito fácil manipular a religião para propósitos pessoais, mas é a isso que se refere o mandamento que proíbe “tomar o santo nome de Deus em vão”
UD: Pretende realizar algum tipo de palestra com os jogadores do Iguaçu no tão sonhado momento de volta aos profissionais?
EB: Nunca pensei nisso. Se o time pedir, posso fazer, sim
UD: O senhor incluso se tornou mestre em espiritualidade, consagrado em Roma. Quanto tempo ficou por lá e nesse tempo qual sua relação com o futebol na Itália?
EB: Quando eu era criança, um tio meu foi para a Itália. Meu irmão, que torcia para a Juventus, pediu uma camisa do seu time. Como ele não sabia que time eu torcia, me trouxe uma da Roma. Portanto, a culpa é dele (risos). Morei dois anos e meio na Cidade Eterna, de 2009 a 2011, e, no primeiro ano, a Roma quase foi campeã, perdendo o título para a Internazionale na penúltima rodada! Foi muito frustrante! Até porque a Roma ganha um título a cada 30 anos (risos).
UD: Existem registros inclusive que você assistiu alguns jogos de futebol no emblemático Estádio Olímpico de Roma. Qual foi o primeiro e qual foi o mais divertido? O senhor decidiu ir aos jogos no Estádio Olímpico por conta própria ou alguém o convidou?
EB: Na verdade, fui num só, contra o Bayern de Munique, pela Champions League em 2010. Meus planos eram para ver um jogo contra um time pequeno. Afinal, eu queria ver meu time ganhar! Alguns colegas iam ver esse jogo da Champions e me convidaram. Eu disse que não iria, porque não queria ver a Roma perder (risos). No dia do jogo, eles voltaram a insistir, porque um dos que iria estava doente. Acabei cedendo e fui. Ao chegar, beijei o chão do estádio. O primeiro tempo terminou com a vitória parcial do Bayern por 2 a 0, mas, no segundo tempo, a Roma virou, com gols de Borrielo, De Rossi e do nosso herói, Totti. Agradeci muito a meus amigos! Foi muito emocionante cantar os hinos da Roma, que conheço desde criança!
UD: O senhor é um fã de livros. Gosta de acompanhar livros de futebol também? No esporte ou em outros assuntos, quais os seus favoritos?
EB: Gosto muito de livros! Costumo ler dois por mês, um da minha área: Espiritualidade, Teologia. Também um de outra área: Literatura, Biologia, Física, Geologia, História. Atualmente estou lendo Comentário ao Cântico dos Cânticos do teólogo egípcio Orígenes e Mecânica de Automóveis para Leigos. É da coleção “Para Leigos”, uma das minhas preferidas. Gosto de livros sobre futebol também!
UD: É comum dizer que os padres apreciam vinho. É verdade que o senhor prefere cerveja? Foi uma influência do futebol?
EB: É verdade (risos). Mas não por causa do futebol, e sim pelo tempo que vivi na Irlanda, como Vigário numa paróquia em Dublin. Minhas preferidas são as irlandesas Kilkenny e Guinness. Se alguém quiser me dar de presente, eu aceito (risos).
UD: Por gentileza, existe algum assunto que não foi perguntado e que gostaria de comentar?
EB: Além do livro e do CD com músicas sobre o Iguaçu, o projeto Onze por todos, todos por onze também tem um CD com músicas sobre a história, a natureza e a cultura das cidades gêmeas de Porto União e União da Vitória. Uma delas fala sobre os Tropeiros, outra sobre os Vapores, o Trem, as Enchentes, os Pontos Turísticos e até um trocadilho com o nome da cidade: “A União dá a Vitória”. Além disso, ainda tem um DVD com 10 videoclipes de nove músicas já presentes nos CDs e mais uma faixa bônus. Os videoclipes apresentam fotos e filmagens do time e da cidade. Inscrevi esse projeto no livro Guinness dos Recordes em duas categorias: Maior homenagem musical feita a uma cidade e um time de futebol por uma só pessoa e maior encarte de CD: o livro, que tem 116 páginas.
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