Em novembro de 2008, quando nem mesmo disputava competições profissionais, o Jaboticabal Atlético passava por momentos conturbados – talvez os mais conturbados de sua quase centenária história. Em seus bastidores, o time possuía uma dívida de quase R$ 1 milhão, que só poderia ser amortizada com o leilão da sede social do clube e do estádio Dr. Robert Todd Locke. Já em campo, o time ainda amargava a eliminação na primeira fase da Segunda Divisão (a rigor, a quarta) do Campeonato Paulista.
Quase um ano se passou, mas o cenário no Jotão continua sendo dos mais desoladores. Lanterna de sua chave no torneio estadual de 2008, quando somou apenas sete pontos em 12 jogos, o time só conseguiu ver sua situação piorar ainda mais. Tanto que, em seus sete primeiros compromissos na Segunda Divisão de 2009, o Jaboticabal sofreu sete derrotas, marcando apenas três gols e sofrendo 18. Nova eliminação, se já não era assegurada, tornou-se fato com a perda de 12 pontos no Tribunal de Justiça Desportiva, que condenou a equipe pela escalação irregular de jogadores.
Por conta de suas administrações recentes, o Jaboticabal se diz vítima do que é chamado (por convenção recente no meio futebolístico) de “herança maldita”: enquanto a montagem dos times fica a cargo de empresários do ramo, a administração do clube cai nas mãos de comerciantes e políticos da cidade – uma receita que pode até dar certo, mas que se mostrou desastrosa e amadora no caso do Tigre da Marechal Deodoro. Ano após ano, tal amadorismo acabou criando a complicada situação atual.
O próprio clube admite que os problemas financeiros pesam. “A divida do Jaboticabal é líquida e certa, nunca neguei isso. Se tem um ano ou dez anos, ela existe”, afirmou Gustavo Borsari, presidente do clube, em entrevista à rádio Athenas, adotando um tom de isenção de responsabilidade pela pendência financeira.
Borsari, porém, demonstrou intenção de solucionar o problema. “A dívida existe, não se nega isso e tem que ser paga”, resumiu o dirigente, que chamou de palhaçada o leilão do patrimônio do clube – que, como previsto, veio a acontecer.
De fato, a venda do Estádio Dr. Robert Todd Locke e da sede social do Jaboticabal Atlético não foi uma negociação das mais simples. Inicialmente, as construções foram avaliadas – por uma empresa terceirizada – em cerca de R$ 4,3 milhões. No entanto, a Justiça entendeu que o valor seria muito alto. Então, somando todas as dívidas do clube, o valor do “pacote” foi drasticamente baixado para R$ 800 mil.
O negócio, nem mesmo assim, despertou interesse inicial. Entretanto, o estádio e a parte social acabaram sendo vendidos separadamente por pouco mais de R$ 900 mil (leia aqui). O comprador não teve seu nome revelado, e pediu para que a quantia fosse parcelada em oito vezes. O juiz responsável pelo caso aceitou.
Mas o leilão irritou o presidente do Jaboticabal Atlético, que entrou com um recurso para suspender a negociação. À imprensa da cidade, Gustavo Borsari culpou a empresa responsável pelo leilão pelo baixo preço do negócio. “Foi uma grande sacanagem o que fizeram com o patrimônio do Jaboticabal Atlético”, afirmou o dirigente, segundo o qual o leiloeiro Rodrigo Aparecido Rigolon da Silva havia anunciado a intenção de aceitar lances “na base de 20%” do valor inicial proposto (R$ 3.970.000,00) para bater o martelo.
Rigolon, porém, evitou bater de frente com o clube, e lembrou apenas que o Jaboticabal poderia acionar os tribunais. “Caso haja embargo, vai demorar um pouquinho mais para o juiz analisar os pedidos de embargos e se for julgado improcedente cancela-se a arrematação”, afirmou o leiloeiro na época.
Dito e feito: o leilão acabou anulado. O patrimônio e a dívida continuam nas mãos do Jaboticabal. Mas em sua nova tentativa de angariar fundos para sanar seus problemas, a equipe acabou apelando para outras fontes emergenciais. Uma delas é a curiosa parceria com uma igreja protestante local, que colocou até mesmo um de seus bispos, Bernardo M. Neto, na vice-presidência da agremiação. Sem sucesso, como se viu na já citada campanha do clube em 2009.
O outro acordo “de destaque” é com o lateral Cicinho, da Roma (Itália), que se prontificou a utilizar sua imagem para atrair investidores para as categorias de base do clube (leia aqui). “Ainda não tenho total conhecimento do projeto, mas é uma coisa para se parar e pensar”, admitiu o jogador, ex-Botafogo-SP, Atlético-MG, São Paulo e Real Madrid, em entrevista ao jornal Tribuna da Região no mês de abril de 2009. “Mas já estou praticamente dentro do projeto e qualquer ajuda que for preciso eu estou disposto a dar. Eu vou fazer o máximo que eu puder para colaborar com isso”, prometeu.
Curiosamente, Cicinho era um dos acionistas do Olé Brasil, clube-empresa recém-fundado em Ribeirão Preto e rival do próprio Jotão na Segunda Divisão do Paulistão deste ano. O lateral, porém, afirma ter deixado o projeto, do qual possuía 20% de responsabilidade (mesma quantia do lateral Roberto Carlos, do Fenerbahce). “Os outros 60% eram da pessoa que nos contratou para usar nossa imagem, mas essa pessoa acabou vendendo o Olé Brasil e eu acabei saindo fora”, diz Cicinho.
Curiosamente, um dos novos investidores do Olé Brasil é a própria prefeitura de Jaboticabal (leia aqui). Responsável por investimentos escassos no clube local, o poder público jaboticabalense aceitou que, por cinco anos, profissionais e campos da cidade estejam à disposição da revelação de promessas para o jovem time de Ribeirão Preto, que lucrará 80% da quantia por negociação de jogador da cidade. Os outros 20% são da Prefeitura.
Os lucros, diferente do que vem acontecendo, podem até vir. Dentro de campo, entretanto, o que se vê é uma grande bola de neve, que pode condenar o Jaboticabal Atlético a um futuro dos mais tenebrosos nos próximos anos.
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