Foram vinte anos de carreira como atleta profissional. O ex-goleiro Valdir Appel passou por 15 equipes e jogou em quase todas as regiões do Brasil. Foram muitos episódios vividos dentro dos gramados por este catarinense de 66 anos. Tantos que o boleiro resolveu reunir parte de suas histórias em dois livros: Na Boca do Gol e O Goleiro Acorrentado. A carreira do arqueiro ficou marcada por um gol contra que ele marcou no Campeonato Carioca de 1969. Um lance semelhante ao que aconteceu com o goleiro Michel do Criciúma num jogo do Campeonato Brasileiro da Série B deste ano. O arqueiro escritor mora em Brusque (SC) e conversou por email com a reportagem do Última Divisão.
Última Divisão: Seu primeiro livro (Na Boca do Gol) contém diversas histórias que o senhor testemunhou como jogador profissional. Qual é a principal diferença deste para o segundo (O Goleiro Acorrentado)?
Valdir Appel: Basicamente, O Goleiro Acorrentado segue a mesma linha do primeiro. São crônicas bem humoradas sobre os bastidores do futebol, profissão que exerci durante vinte anos. Tenho um acervo de fotos, livros, revistas que ajudam na pesquisa e na ilustração dos textos.
UD: Num dos melhores capítulos do Na Boca do Gol, há uma história de eliminação que o senhor viveu jogando pelo Alecrim. Parece que você tinha feito inclusive uma promessa para conseguir a vaga. Como foi isso?
VA: O Alecrim foi um divisor de águas na minha carreira. Após a cirurgia que custou minha saída do Vasco, joguei pelo CEUB de Brasília ainda com os reflexos de uma má recuperação. Em Natal, recuperei meu joelho totalmente nas águas potiguares. Para ficar bom ficar bom e levar o Alecrim às finais do campeonato deixei até de beber cerveja.
UD: De todos os técnicos que o senhor teve qual foi o melhor?
VA: Conheci vários técnicos competentes: gosto de citar Elba de Pádua Lima (Tim), Zezé Moreira e Paulinho de Almeida. O primeiro um senhor estrategista; o segundo um conhecedor profundo do futebol, educadíssimo; Paulinho herdou do Zezé a disciplina, a rigidez e era extremamente imparcial nas decisões.
UD: O senhor jogou numa época em que o Campeonato Brasileiro era longo e com diversas equipes. Quais as vantagens e desvantagens de jogar uma competição dessa maneira?
VA: No passado, as viagens longas e cansativas contribuíam muito para o desgaste das equipes, somando-se a isso os campos ruins e pequenos, que fortaleciam os esquemas das equipes do interior. Numa época em que nenhum clube ia jogar fora com o argumento de que o empate era um bom resultado.
UD: O mercado editorial está expandindo o espaço para obras literárias sobre futebol. Por quê poucos ex-atletas resolvem lançam livros como o senhor?
VA: Mesmo não tendo lançado meus livros como uma biografia – já que passeio pelo tema futebol, contando causos e histórias, presenciadas à beira do gramado, dentro ou em torno dele. Meus livros falam de momentos, lances curiosos, atletas folclóricos e todos aqueles que estão nos bastidores de um time de futebol (médicos, roupeiros, massagistas, dirigentes, torcedores, jornalistas, etc…) e jogos inesquecíveis; é impossível não deixar nas entrelinhas o perfil do escritor. O atleta dedica-se integralmente ao futebol e pouco tempo sobra para estudar. São praticamente dez anos em busca da independência financeira. Irá sentir a falta dos estudos após o termino da carreira. Por isso não poucos se sentem preparados para escrever suas memórias.
UD: O senhor jogou por diversas equipes tidas como menores. Quais eram as principais dificuldades em atuar por esses clubes?
VA: Salários baixos, atrasados, que dificultavam o dia a dia do atleta e da família. Mesmo sabendo que o jogador no dia do jogo esquece os problemas e procura dar o máximo (porque sabe que se não fizer o máximo a tendência é piorar), leva dentro dele os problemas da semana, não resolvidos no clube e na família, que refletem no seu desempenho.
UD: O senhor jogou pelo Goiânia. Atualmente, o clube está disputando a segunda divisão estadual. Para o senhor é muito triste ver o atual momento do time?
VA: Tenho o Goiânia no coração, praticamente encerrei a minha carreira no Galo. Engraçado (é uma longa história) é que joguei praticamente de graça por lá, dei meu passe de presente ao clube e depois dei lucro ao ser vendido ao Atlético. Em contrapartida, após abandonar o futebol fui convidado e fui treinador das equipes de juniores e juvenis por um período de um ano. Descobri que não nascera para o cargo e me demiti ao final da temporada, mesmo deixando bons resultados. Gostaria de vê-los de volta a elite. Sempre que vou a Goiânia procuro pessoas envolvidas com o clube.
UD: O senhor ficou conhecido por um gol contra num jogo Vasco e Bangu pelo Campeonato Carioca de 1969. O lance foi parecido com o lance do goleiro Michel Alves do Criciúma no jogo contra o América de Minas. Esse episódio marcou a carreira do senhor?
VA: Marcou, mas não encerrou a minha carreira. O mesmo acontecerá com o Michel, que tem o beneficio da imagem para mostrar que já superou o episodio.
UD: Como ex-atleta experiente, o que o senhor diria para o Michel?
VA: Que tenha muita paciência com os torcedores porque irá contar este momento pelo resto da sua vida. Eu já conto há 43 anos.
UD: Na sua opinião, quais são os grandes goleiros brasileiros na atualidade?
VA: Gosto muito do Rafael do Santos. Ele é jovem ainda mas revela uma personalidade marcante. É um atleta discreto, seguro e tem tudo para se firmar entre os melhores da posição. Jefferson, Felipe, Victor e Diego Cavalieri são bons goleiros. Mas podem render mais.
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