O Cianorte (PR) anunciou nesta quarta-feira ter conquistado na justiça uma vaga na Série C do Campeonato Brasileiro de 2014. Detalhe: a equipe paranaense não disputou nenhuma divisão do Campeonato Brasileiro em 2013 – ou seja, não foi rebaixada da Série B, nem promovida da Série D. E o caso é sintomático ao apontar quão frágil é o momento da justiça desportiva brasileira.
O clube paranaense se sentiu no direito de disputar a Série C de 2014 por ter sido o quinto colocado da Série D de 2012 (entenda aqui). Parece absurdo? E é. Mas acontece que, pelo Estatuto do Torcedor, o regulamento de cada competição precisa ser mantido por pelo menos dois anos após qualquer mudança. E foi exatamente isso que aconteceu na Série C de 2013.
Em 2012, o Treze-PB conseguiu uma vaga por ter sido o quinto colocado da Série D de 2011. Como o Rio Branco (AC) foi excluído da Série C 2012, o time paraibano ganhou na justiça o direito de substituí-lo. Porém, a equipe acreana recuperou a vaga no decorrer do torneio de 2013, e como o Treze não foi excluído, a Série C do ano passado foi disputada com bizarros 21 clubes – 11 em um grupo, do qual foram rebaixados três, e 10 do outro grupo, do qual foram rebaixados dois.
A prerrogativa foi a mesma utilizada pelo Cianorte. Como o “regulamento” de 2013 contemplou o quinto colocado da Série D de dois anos antes, a diretoria paranaense utilizou o Estatuto do Torcedor para repetir a regra. Assim, após ter sido o quinto colocado da Série D de 2012, a equipe do Vale do Ivaí foi à justiça comum e conseguiu a reedição do feito.
“O Cianorte Futebol Clube luta por seus direitos em relação aos desmandos da Confederação Brasileira de Futebol referentes ao caso Série C envolvendo o clube. Durante o ano passado o caso foi julgado em todas as esferas desportivas e foi negado. Com isso, o clube entrou com a ação no início da semana, via justiça comum, e aguarda uma solução para o caso. O clube recebe total apoio da Federação Paranaense de Futebol”, diz a nota oficial do clube.
Segundo o presidente do Cianorte, Lucas Franzato, a FPF incentivou a iniciativa. “Nosso advogado é o mesmo da FPF”, diz o dirigente. “O nosso processo foi julgado em todas as esferas desportivas e foi negado. Por isso entramos na justiça comum”, completou.
Liminar concedida ao Cianorte incluindo o CianorteFC na Serie C
— Cianorte F.C. (@cianortefutebol) January 16, 2014
Ainda segundo a nota divulgada pelo Cianorte nesta quarta-feira, “o clube espera que, em ano de Copa do Mundo, a entidade maior do futebol brasileiro consiga organizar de forma justa a terceira divisão de seu país”.
A decisão é encarada com descrença, mas a inesperada presença do Cianorte na Série C de 2014 (que pode ter 21 clubes novamente) não pode ser descartada. Mais do que isso, reforça o momento de descrédito que a organização dos campeonatos e a justiça desportiva vivem com a torcida.
Desdobramento de 2011
Se o caso do Cianorte fosse isolado, seria apenas constrangedor para a Série C e para a CBF como organizadora das quatro divisões do Campeonato Brasileiro. O problema é que, por ser reflexo de um problema de anos anteriores, o caso expõe buracos no Campeonato Brasileiro, indicando que uma questão de 2011 vira uma bola de neve e abrindo brechas para complicações futuras.
Na Série C de 2011, o Rio Branco (AC) era líder do Grupo A, mas foi impedido de jogar na Arena da Floresta por conta de uma ação do Procon local. Com o apoio do governo do estado, o clube procurou a justiça comum e viabilizou seus jogos no estádio. O STJD não gostou e suspendeu o time da competição – no caso, da segunda fase, para a qual já estava classificado.
O Grupo E da segunda fase da Série C de 2011 tinha Paysandu, CRB, América-RN e Rio Branco, mas a equipe acreana acabou levando a pior na queda de braço jurídica e fui substituída pelo Luverdense (terceiro colocado do Grupo A, do qual avançariam Rio Branco e Paysandu). Desgastado, o Rio Branco foi excluído do torneio.
Como a Série C daquele ano teve quatro rebaixados (Araguaína, Campinense, Marília e Brasil de Pelotas) e um excluído (Rio Branco), o quinto colocado da Série D de 2011 se sentiu no direito de pleitear a vaga acreana na justiça – e conseguiu. No entanto, durante a Série C de 2013, o Rio Branco reconquistou a vaga na justiça – e como a CBF ficou de mãos atadas, incluiu um 21º time durante a competição, com os grupos de 11 e 10 times (aqui, a decisão do STF).
A Série C de 2014 teria novamente 20 times, já que cinco clubes caíram em 2013 (três de um grupo e dois do outro) e quatro foram promovidos da Série D. Mas se um time da Série D de 2011 conseguiu jogar a Série C dois anos depois sem ter subido, por que o quinto colocado da Série D de 2012 não pode fazer o mesmo dois anos depois? Com a palavra, a CBF.
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