A clássica propaganda da Amanco não deixa dúvidas. Quando o assunto são torneios interclubes o futebol argentino se gaba de números difíceis de serem superados pelas equipes brasileiras em ao menos algumas décadas. Nos dois campeonatos continentais mais importantes da atualidade, vemos nossos vizinhos de muito longe: são 22 títulos deles contra 16 nossos, na Libertadores, e uma diferença de 5 a 1, na Sul-Americana.
O histórico argentino é favorável mesmo nas vezes em que times considerados pequenos chegaram a finais internacionais, como ficou comprovado nos títulos impressionantes de Argentinos Jrs e Arsenal de Sarandí. Do outro lado da fronteira, São Caetano, Goiás e até o CSA de Maceió sucumbiram a um passo da glória completa – no caso dos alagoanos, justamente diante de um nanico do país rival, o Talleres, em história que já foi contada aqui.
Pois a mística internacional dos clubes menos tradicionais da Argentina será colocada à prova mais uma vez. Apesar de comemorarem publicamente a vitória do Tigre nas semifinais da Copa Sul-Americana, os são-paulinos terão uma parada dura na decisão contra um adversário conhecido como “matador”.
Tigre Matador
A alcunha vem do fim dos anos 60, quando o clube da cidade de Victoria, às margens do Rio Tigre, na Grande Buenos Aires, resgatou um uniforme utilizado em seus primeiros anos de história, com listras verticais vermelhas e azuis. O desenho se assemelhava à camisa tradicional do San Lorenzo de Almagro, equipe da moda na Argentina da época, admirada em todo o país pela brilhante campanha que resultou no título do Torneio Metropolitano de 1968, com um time apelidado de “Los Matadores”.
O San Lorenzo é, portanto, o “matador” original e o fato é lembrado até hoje em alguns cantos de torcida. Todavia, enquanto o clube de Almagro vive dias difíceis, o apelido faz mais sentido atualmente para o pequeno Tigre, que atravessa o melhor período dos seus 110 anos de vida.
O simples fato de permanecer na Primeira Divisão argentina desde 2007 já é motivo para comemorar. Até então, foram outras seis passagens pela elite, com dificuldades para se manter no topo por mais de três anos. Apesar de ser um dos clubes que profissionalizaram o futebol na Argentina, em 1931, e de ter revelado ídolos da seleção nacional, como Bernabé Ferreyra (rival de Arthur Friendeirech no posto de grande craque sul-americano nos anos 30), o Tigre sempre foi uma equipe de segundo escalão e, antes de subir pela última vez, ficara 27 anos oscilando entre divisões menores.
Nesse último acesso, uma nota triste: após vencer o Nueva Chicago na final, o clube viu sua festa manchada por incidentes violentos, que começaram com uma invasão de campo da torcida derrotada e se estenderam para brigas fora do estádio, resultando na morte de um torcedor.
Três vices em cinco anos
Logo na primeira temporada de volta à elite, o Tigre conseguiu resultados empolgantes, com vitórias convincentes contra gigantes do país: 3 a 2 no Racing, 2 a 1 no Boca e sonoros 4 a 1 no River Plate. Até a penúltima rodada, a equipe manteve chances de se sagrar campeã e terminou a Apertura de 2007 na segunda colocação, quatro pontos atrás do Lanús, outro time pequeno que surpreendeu naquele ano.
Na Clausura, já no primeiro semestre de 2008, apenas um intermediário 13º lugar. No Apertura seguinte, porém, o Tigre conseguiu repetir a colocação do ano anterior e fez sua melhor campanha na história: ao fim das 19 rodadas de torneio, o clube empatou em pontos com Boca Juniors e San Lorenzo na liderança, forçando a realização de um triangular para decidir o campeão. Faltou muito pouco: o Tigre venceu o Boca por 1 a 0 na Bombonera, mas perdeu por 2 a 1 para o San Lorenzo em casa. Com uma vitória de 3 a 1 contra o San Lorenzo, o Boca se tornou campeão por ter um gol a mais de saldo.
Nos campeonatos seguintes, o representante de Victoria fez campanhas que variaram entre péssimas e regulares: 13º (Clausura 2009), 20º (Apertura 2010), 11º (Clausura 2010, Apertura 2011 e Clausura 2011) e 7º (Apertura 2012). A irregularidade levou o Tigre a uma situação curiosa na última rodada do Clausura 2012, em junho deste ano: a equipe poderia se sagrar campeã ou ser rebaixada, já que o sistema de descenso argentino leva em conta a média de pontos nas últimas três temporadas. Um empate por 2 a 2 contra o Independiente afastou as duas possibilidades e representou o terceiro vice-campeonato em cinco anos.
Após alcançar uma mudança de patamar no futebol interno, com resultados expressivos e presença constante na elite, o Tigre começa a trilhar seus primeiros feitos fora do país. Na estreia em um torneio internacional, pela edição de 2009 da Sul-Americana, o clube caiu para o San Lorenzo, logo na primeira eliminatória, pelo critério do gol fora de casa.
Na Sul-Americana 2012, logo no segundo campeonato continental disputado, uma campanha baseada em grandes resultados jogando como mandante: Argentinos Jrs, Deportivo Quito-EQU, Cerro Porteño-PAR e Millornarios-COL ficaram para trás. A façanha já representou uma vaga para a Pré-Libertadores do próximo ano, a primeira da história do time.
Nessa escalada de grandeza, o próximo passo parece ser a conquista de um título de primeira linha. O “matador” vai dar a vida nesta final contra o São Paulo.
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